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SOBRE A MONTAGEM

Um texto, um diretor, um espaço para ensaio, possibilidades e pontos de interrogação. Recursos financeiros? Nenhum. Mas, não era essa uma carência que impediria a caminhada. Faltava o elemento principal, a atriz. Michelle Ferreira topou a empreitada.  A montagem d’A Jagunça seria, e foi!, literalmente um projeto “fora da lei”. Fora das leis de incentivo e de qualquer sistema de financiamento à cultura, público ou privado. A nós juntou-se o músico Flávio Cravo. O que tínhamos era o texto, o diretor, a atriz, um músico, o desejo de fazer, um espaço vazio, grande como a imensidão do sertão, a ser preenchido e uma distância considerável a ser vencida, pois Michelle estava morando em Conceição do Mato Dentro e eu em Ouro Branco, 296 km um do outro. O meio do caminho, Belo Horizonte, foi o ponto de encontro, o ponte de encontros. Mas, trabalhos literalmente de campo foram realizados nos outros dois municípios, com corridas por matas, entrada em caverna pouco visitada e observação das pessoas da zona rural. A distância e agendas inviabilizavam a continuidade da caminhada. Um ano depois, o processo foi retomado, desta vez com Ildeu Ferreira interpretando A Jagunça, numa espécie de exercício de Diadorim às avessas e Antônia Claret na assistência de direção.

LINGUAGEM / ESTÉTICA

O texto, que transita por narrativas poéticas, pelo quase surrealismo em algumas cenas e pela crueza dramática em tantas outras, imprime uma força imagética que, aliada à elementos constitutivos do meio rural, ditaram o caminho a trilhar. Para entrar na profundeza de nosso sertão e extrair as forças vivas que definem seus traços, buscamos o entrecruzamento de linguagens. Da linguagem textual/oral, com a musical, a plástica e a interpretativa.  Nesse ato de composição criativa, os sentidos já existentes em cada linguagem deveriam ser preservados e ao mesmo tempo aguçados pela união das partes para promover no expectador o sentimento de encontro com a estranheza, o fascínio e grandeza da vida. Desta forma o texto, com seus jargões, expressões, ritmo e melodia, ganhou reforço com o acompanhamento sonoro-percussivo composto e executado ao vivo por Flávio Cravo, que ora realça e dá tonicidade aos momentos dramáticos de fugas e conflitos da protagonista, ou que ora, como paisagens sonoras, conduzem o espectador para o interior do sertão de dentro, interior de nossa terra, de nossa personagem e de nós mesmos, levando-o a experimentar de sua aspereza, de sua beleza e de seu lado insólito.

CENÁRIO

Buscar na natureza das coisas o que é conveniente ou adequado! Na montagem da Jagunça a “coisa” maior é a própria natureza, nossa aliada e uma apoiadora. Uma árvore seca, um toco de madeira e um “tapete” de folhas secas foram recolhidos no campo, uma caveira de boi (única coisa que sobrou da terra de um sertanejo, depois de ter sido desapropriado por uma mineradora da zona rural de conceição do Mato Dentro), uma velha cela de montaria, velhas jutas e esteiras de taboa da Insólita Casa de Artes, compõem o recorte de sertão, não como tentativa de reprodução natural do sertão mineiro, mas como parte ocre-terra do sertão de Zinha que se impõe num determinado espaço-tempo.

      figurino  

O universo de Zinha é gasto, surrado pelo tempo. Um colete de couro remodelado e costurado novamente por um alfaiate em Ouro Branco. De um pano velho foi feita sua calca e vestido. Um cinturão de couro com as preces e invocações da personagem, roupagem  que cose e arma o corpo de Zinha.

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